domingo, 21 de novembro de 2010

Quando e Por Que Fazer Terapia?

Por que procurar um psicólogo? Quando deve ocorrer? Todos precisam de terapia?
Não considerando casos extremos onde a busca é inevitável por uma série de contingências que rodeiam algumas pessoas, como responder às questões acima, tão comuns na vida de quem abraça esta profissão? Por ser rotineiramente abordada sobre este tema, principalmente em situações "não clínicas" ( o clima descompromissado permite mais facilmente esta "investigação"), decidi fazer algumas pontuações, mesmo que de maneira extremamente sucinta e superficial. Tento aqui responder à curiosidade que cerca um bom número de pessoas que apesar de se sentirem atraídas, não tiveram movimento de busca ou por inibição, ou por não terem conhecimentos mínimos do que seja.

Sendo assim...

Quando as coisas se confundem...

Quando a infelicidade parecer ser maior do que a que podemos suportar...

Quando cremos que o destino nos prega peças...

Quando nos sentimos vítimas das situações que nos envolvem...

Quando nos percebemos excessivamente queixosos...

Quando atribuímos a outros a responsabilidade que é nossa...

Quando sentimos desconforto emocional...parece nada estar bom...

Quando não percebemos que podemos optar...

Quando não percebemos nossa impotência...

Quando sofremos perdas significativas...
...creio que a decisão de buscar um processo terapêutico seja bastante acertado.

"Mas a psicóloga não vai resolver o meu problema..."

.É correto. No entanto, é esperado que este indivíduo descubra junto a este trabalho clínico, não só caminhos alternativos como também que passe a enxergar a problemática de uma outra maneira, sem tanta dor. Conseguir ver o outro lado da moeda faz com que as pessoas redimensionem a situação e com isto passem a lidar com ela de maneira menos extenuante.

"Isto é coisa para louco e eu não sou..."

Argumentos deste tipo ainda, infelizmente existem. Geralmente acompanham pessoas que além de serem radicais, tem sua vida pautada naquilo que o outro vai pensar. Estão presas a estereótipos consagrados por uma cultura ultrapassada. Muitas vezes são os que mais precisaria deste tipo de ajuda.

"Eu não preciso deste tipo de auxílio; eu sei lidar com a vida...",

Mesmo que apresente alterações de humor, visíveis pelas pessoas que com ela convivem. Mostram temor em se expor, em serem vistas; trata-se de pessoas que tem muito medo de si mesmo, fantasiando culpas e, portanto punições. Não conseguem perceber como esta onipotência é pesada.
Verdades cristalizadas, sustentadas e perpetuadas, absorvidas no seio familiar, nunca repensadas são, muitas vezes as causadoras de transtornos emocionais que serão minimizadas, clarificadas, atenuadas ou resolvidas através do conhecimento de si próprio, através do diálogo consigo mesmo, intermediado e traduzido pela figura do terapeuta; o refletir, o voltar-se para "dentro", o buscar as razões, embora algumas vezes dolorido (outras vezes gratificantes), traz a tona aspectos até então adormecidos mas nem por isto menos atuantes. A constatação mais evidente desta situação são as tão faladas doenças psico-somáticas; aparecem sob forma orgânica como mais um aviso de que as coisas não vão bem.
Quero enfatizar que embora tenha pontuado alguns exemplos quase que a justificar o envolvimento com o processo terapêutico, o grande objetivo deste trabalho é o crescimento pessoal que fatalmente vem em decorrência auto-conhecimento, independente de ter-se ou não alguma queixa específica.
É através do relato oral projetando o pensamento ( que deve estar carregado de emoção), que se chega a descobertas. O sentir, o reviver, o trazer para dentro do consultório, episódios eleitos pelo próprio indivíduo faz com que pouco a pouco se inicie a discriminação e o reconhecimento interior, tão necessários para a saúde mental; o entrar em contato com nossas "coisas", com nossos conflitos, nem sempre é "leve" mas com certeza é passar a conviver com as verdades, tão fundamental para o real fortalecimento.

O ter para si a "posse" daquele horário e local onde tem-se o direito de ser por inteiro, falar o que quiser, explorar temas escolhidos, buscar fundamentos, falar e aprender a ouvir a própria voz numa interação de empatia com o terapeuta, o ter o espaço próprio, diante de tanta solicitação da vida, é uma situação não só gratificante como enriquecedora.

Por ser um trabalho pessoal, o vínculo só se concretizará, só se estabelecerá propiciando mudanças, se a entrega real, verdadeira, se a opção vier de foro íntimo e não cumprindo "ordens" de parentes bem intencionados que sugeriram este tipo de tratamento. Evidentemente que colhemos opiniões aqui e acolá mas que estes argumentos tenham servido para convencer sinceramente e não como alguns casos que dão este passo para livrar-se de tantos "palpites" trazendo no seu bojo a resistência e a descrença; neste caso a busca é infrutífera. É a pessoa que tem que querer, ninguém mais, pois o desejo é do outro e não dele mesmo. Há necessidade ímpar de disponibilidade interna.

O investimento em nós mesmos é não só um direito como um dever que todos temos pois, ao passarmos por exemplo, da autocomiseração, da fragilidade, do choro lamentoso, da pseudo-alegria ou simplesmente da situação rotineira e comum para um estado emocional realmente fortalecido, passamos a atingir aqueles que nos rodeiam de maneira também positiva e criativa.

É por este motivo por exemplo que não são raros os casos de encaminhamento para terapia a mãe ou o pai ao invés do filho que está apresentando algum problema. Identificou-se neste caso o quanto são os pais os geradores destes conflitos que despejaram nos filhos suas angústias, seus temores, seus anseios, suas expectativas.

Sentimentos tais como inveja, rejeição, raiva, tão comuns nas relações familiares, por serem condenados na nossa cultura, geralmente são negados sendo, por conta disto canalizados de forma distorcida gerando irritação, autoritarismo, ausência de compreensão. O nível de exigência entre marido e mulher são também muitas vezes o causador de discórdias conjugais pois é difícil aceitar do outro o que ele pode dar e não o que eu quero que ele dê; este é um caso que tipifica a confusão emocional por ignorarem que são pessoas diferentes embora haja forte afeto; são aqueles casos que se sustentam pela cobrança e queixa no dia a dia: "...você poderia ter trazido... você poderia ter se lembrado..." ficando o estabelecido, sempre neste tempo verbal (poderia, gostaria) acompanhado do complemento "...se você gostasse... se você quisesse..."

Renunciar as próprias vontades significa renunciar a si mesmo e, quando "acordamos", percebemos que somos muito mais fruto daquilo que pensam que somos do que aquilo que realmente somos.

O assunto é extensíssimo e muitos outros fatores poderiam ser abordados. Jamais teria a pretensão de esgotá-lo. Ficam registrados aqui apenas uns poucos enfoques ilustrativos como pinceladas dentro de um trabalho desafiante.

Comecei com perguntas e termino com elas:

Quem é você além dos diversos papéis que desenvolve (pai, mãe, filho, namorado, profissional, amigo...)? Diante de todo este emaranhado, você consegue se olhar?
Texto de Eneida Souza Cintra